Afonso Lopes Vieira

Era filho de Afonso Xavier Lopes Vieira e de Mariana Xavier Lopes Vieira, e sobrinho-neto do poeta, prosador e jornalista António Xavier Rodrigues Cordeiro.

Na aldeia de Cortes – Leiria, na livraria em casa do seu tio-avô, privou com os clássicos aí existentes. A  sua vida foi vivida entre o seu solar em Lisboa e a casa de Verão de São Pedro e complementada com algumas viagens por Espanha, França, Itália, Bélgica, norte de África e Brasil.

Ainda que, nas palavras do poeta, fosse “um aluno medíocre” formou-se em Direito pela Universidade de Coimbra em 1900. Declinou o cargo de subdelegado régio e tentou a carreira de advogado sob a alçada do pai até 1906, ano em que aceitou o cargo de redator na Câmara dos Deputados que viria a exercer até 1916.

Quanto à sua dedicação à literatura, é em 1897 com a obra Para Quê? que se estreia. No entanto, só em 1916 se dedica em exclusivo a esta atividade que se prolonga até 1947, data em que publica o seu último livro, Branca Flor e Frei Malandro. Pelo meio, “perdidos” entre publicações em jornais, artigos, cartas e entrevistas, ficaram ainda mais de uma dúzia de obras literárias, canções e fotografias

Foi um acérrimo defensor do património cultural português, o que lhe valeu o reconhecimento de alguns (do regime político) e a crítica de outros (de Fernando Pessoa). No entanto, com o texto Éclogas de Agora, publicado em 1935, demarca-se da ideologia salazarista.

Afonso Lopes Vieira foi um eclético homem de cultura. É considerado um ilustre poeta e ficcionista, um dos primeiros representantes do neogarretismo, ligado à corrente conhecida como Renascença Portuguesa.

Pela sua obra, foi imortalizado na transformação da sua casa em museu. A casa-museu é um lugar literário, sem dúvida, mas também um lugar de memória, já que, em cada canto, em cada azulejo, em cada móvel, em cada livro, enfim, em cada objeto, permanecem a sensibilidade, a inteligência e a escrita do poeta.  

A Biblioteca Municipal de Leiria, Biblioteca Municipal Afonso Lopes Vieira, teve a sua origem na doação do espólio e livraria privada do escritor à cidade natal.

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Bartolomeu marinheiro

Era uma vez
um capitão português
chamado Bartolomeu
que venceu
um gigante enorme e antigo.

Bartolomeu, em menino
pequenino,
ia para o pé do mar…

e ficava a olhar
o mar…
E Bartolomeu cismava…
Ó que lindo, ó que lindo,
o mar, e a sua voz profunda e bela!
Uma nuvem no céu, era uma caravela
que novos céus andava descobrindo…

Ó que lindo, os navios,
que vão suspensos entre a água e o céu,
com velas brancas e mastros esguios,
e com bandeiras de todas as cores!
Bartolomeu cismava
porque ouvia
tudo o que o mar contava
e lhe dizia.

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 Linda Inês

Choram ainda a tua morte escura

Aquelas que chorando a memoraram;

As lágrimas choradas não secaram

Nos saudosos campos da ternura.

 

Santa entre as santas pela má ventura,

Rainha, mais que todas que reinaram;

Amada, os teus amores não passaram

E és sempre bela e viva e loira e pura.

 

Ó Linda, sonha aí, posta em sossêgo

No teu muymento de alva pedra fina,

Como outrora na Fonte do Mondego.

 

Dorme, sombra de graça e de saudade,

Colo de Garça, amor, moça menina,

Bem-amada por toda a eternidade !

 

Pinhal do Rei

Catedral verde e sussurrante, aonde
a luz se ameiga e se esconde
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar:
ditoso o “Lavrador” que a seu contento
por suas mãos semeou este jardim;
ditoso o Poeta que lançou ao vento
esta canção sem fim…

Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
rei D. Dinis, bom poeta e mau marido,
lá vem as velidas bailar e cantar.

Encantado jardim da minha infância,
aonde a minh’alma aprendeu;
a música do Longe e o ritmo da Distância
que a tua voz marítima lhe deu;
místico órgão cujo além se esfuma
no além do Oceano, e onde a maresia
ameiga e dissolve em bruma,
e em penumbra de nave, a luz do dia.
Por estes fundos claustros gemem
os ais do Velho do Restelo…
Mas tu debruças-te no mar e, ao vê-lo,
teus velhos troncos de saudades fremem…

Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
são as caravelas, teu corpo cortado,
é lo verde pino no mar a boiar.

 

Maria José Leite

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