Alexandre Herculano

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“Querer é quase sempre poder: o que é excessivamente raro é o querer.”

Nascido no seio de uma família da classe média, estudou Humanidades na Congregação do Oratório, onde se iniciou também na leitura meditada da Bíblia, o que viria a marcar a sua forma de ver o mundo.

Dificuldades económicas e familiares impediram-no de frequentar a universidade, pelo que se preparou para ingressar no funcionalismo público, frequentando um curso prático de Comércio e estudando Diplomática na Torre do Tombo, aprendendo aí os rudimentos da investigação histórica. Por esta altura, com 18 anos, já se manifestava a sua vocação literária: aprendeu o francês, o inglês e o alemão, tomou contacto com a literatura romântica estrangeira, e iniciou-se nas tertúlias literárias da Marquesa de Alorna, que viria a reconhecer como uma das suas mentoras.

Em 1831, envolvido numa conspiração contra o regime miguelista, foi obrigado a exilar-se, primeiro em Inglaterra e depois em França.

No exílio, aperfeiçoou o estudo da história, familiarizando-se com as obras de historiadores e lendo os que viriam a ser os seus modelos literários, com destaque para Chateaubriand, Victor Hugo, Lamennais, Klopstock e Walter Scott.

Em 1832, participou no desembarque das tropas liberais em Mindelo e na defesa do Porto, cidade onde exerceu o cargo de segundo-bibliotecário, sendo-lhe  entregue a tarefa de organizar os arquivos da biblioteca.

Entre 1834 e 1835, publicou importantes artigos na revista Repositório Literário, do Porto, (posteriormente compilados em Opúsculos). Em 1836, por discordâncias com o governo setembrista, demitiu-se do seu cargo de bibliotecário e publicou o folheto A Voz do Profeta. Em Lisboa, dirigiu a mais importante revista literária do Romantismo português, O Panorama, colaborando com diversos artigos, narrativas e traduções, nem sempre assinados.

Em 1839, aceitou o convite de D. Fernando para dirigir as bibliotecas reais da Ajuda e das Necessidades, prosseguindo os seus trabalhos de investigação histórica, que viriam a concretizar-se nos quatro volumes da História de Portugal.

 Envolveu-se numa polémica com o clero, ao questionar o milagre de Ourique, polémica que daria origem aos opúsculos Eu e o Clero e Solemnia Verba. Eleito deputado pelo Partido Cartista em 1840, demitiu-se no ano seguinte, desencantado com a atividade parlamentar.

De regresso à política, fundou, em 1851, o jornal O País e, em 1853, o jornal O Português. Dois anos depois, foi nomeado vice-presidente da Academia Real das Ciências e incumbido pelos seus pares da recolha dos documentos históricos anteriores ao século XV – tarefa que resultou na publicação dos Portugaliae Monumenta Historica.

Neste mesmo ano tornou-se um dos fundadores do partido progressista histórico e, em 1857, atacou a Concordata com a Santa Sé, envolvendo-se, entre 1860 e 1865, em nova polémica com o clero, ao defender o casamento civil no âmbito da redação do primeiro Código Civil Português. Em 1865, resultado das suas reflexões, saíram os Estudos sobre o Casamento Civil.

Em 1867, desgostoso com a morte precoce de D. Pedro V, rei em quem depositava muitas esperanças, e desiludido com a vida pública, retirou-se para a sua quinta em Vale de Lobos, onde se dedicou quase exclusivamente à vida rural, casando entretanto com D. Maria Hermínia Meira, sua namorada da juventude.

Apesar deste novo e voluntário exílio, interveio em 1871 contra o encerramento das Conferências do Casino, orientou em 1872 a publicação do primeiro volume dos Opúsculos e manteve correspondência com várias figuras da vida política e literária.

Juntamente com Almeida Garrett, é considerado o introdutor do romantismo em Portugal, devendo-se-lhe a teorização desta nova corrente literária e o surgimento do romance histórico no nosso país, inspirando-se em Walter Scott e Victor Hugo.

Reconhecido como cidadão, escritor e estudioso de excelência, várias foram as honrarias com que foi distinguido, aceitando algumas de caráter científico, mas recusando distinções honoríficas (rejeitou a sua nobilitação, ao contrário de Camilo Castelo Branco e Almeida Garrett, que vieram a tornar-se condes).

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A Graça

Que harmonia suave
É esta, que na mente
Eu sinto murmurar,
Ora profunda e grave,
Ora meiga e cadente,
Ora que faz chorar?
Porque da morte a sombra,
Que para mim em tudo
Negra se reproduz,
Se aclara, e desassombra
Seu gesto carrancudo,
Banhada em branda luz?
Porque no coração
Não sinto pesar tanto
O férreo pé da dor,
E o hino da oração,
Em vez de irado canto,
Me pede íntimo ardor?

És tu, meu anjo, cuja voz divina
Vem consolar a solidão do enfermo,
E a contemplar com placidez o ensina
De curta vida o derradeiro termo?

Oh, sim!, és tu, que na infantil idade,.
Da aurora à frouxa luz,
Me dizias: «Acorda, inocentinho,
Faz o sinal da Cruz.»
És tu, que eu via em sonhos, nesses anos
De inda puro sonhar,
Em nuvem d’ouro e púrpura descendo
Coas roupas a alvejar.
És tu, és tu!, que ao pôr do Sol, na veiga,
Junto ao bosque fremente,
Me contavas mistérios, harmonias
Dos Céus, do mar dormente.
És tu, és tu!, que, lá, nesta alma absorta
Modulavas o canto,
Que de noite, ao luar, sozinho erguia
Ao Deus três vezes santo.
És tu, que eu esqueci na idade ardente
Das paixões juvenis,
E que voltas a mim, sincero amigo,
Quando sou infeliz.
Sinta a tua voz de novo,
Que me revoca a Deus:
Inspira-me a esperança,
Que te seguiu dos Céus!…

 

“Eu não me envergonho de corrigir os meus erros e de mudar de opinião, porque não me envergonho de raciocinar e aprender.”

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MJLeite

 

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