Alexandre O’Neill

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“O dever do Homem perante a vida consiste em seguir sempre em frente.”

Descendente de irlandeses (herdou oapelido de um antepassado irlandês fugido para Lisboa na década de 40 do século XVIII), frequentou o Colégio Valsassina, mas viria a abandonar o Curso Geral dos Liceus, manifestando o desejo de dedicar-se à vida marítima.Fez exames para a Escola Náutica onde terminou o primeiro ano,mas, perante a impossibilidade de obter a cédula marítima para exercer pilotagem devido à sua miopia, não continuou os estudos.

Da sua infância, O’Neill guardou recordações de um menino triste e fechado, a espreitar a Rua da Alegria dum quarto andar, as visitas breves e marcantes da avó Maria O’Neill (escritora, sufragista, feminista, vegetariana) e as férias passadas em Amarante, terra natal da mãe, onde conheceu Teixeira de Pascoaes.

O seu gosto pela leitura manifestou-se desde cedo, o que poderá ser explicado pelo facto de a sua avó ser escritora e de o pai ter uma vasta biblioteca.

Estreou-se na escrita ainda estudante do liceu, publicando com dezassete anos os primeiros versos num jornal de Amarante, o Flor do Tâmega, não tendo esta atividade sido grandemente incentivada pela família, apesar de ter recebido prémios literários no Colégio Valsassina.

Aos vinte e um anos, na sequência de um conflito familiar, abandonou a casa dos pais e foi viver com um tio.

Fundou, com Mário Cesariny, José-Augusto França, António Domingues, Fernando Azevedo, Moniz Pereira, António Pedro e Vespeira, o Movimento Surrealista de Lisboa, decorrendo as primeiras reuniões na Pastelaria Mexicana.Publicou então a sua primeira obra, “A Ampola Miraculosa”. As posições antineorealistas eram frontais e provocatórias, como o eram as atitudes contra o regime: em abril, o grupo retira a sua colaboração da III Exposição Geral de Artes Plásticas, por recusar a censura prévia que a comissão organizadora impusera.

Não conseguindo viver apenas da sua arte, o autor alargou a sua ação à publicidade. Afirmava «viver de versos e sobreviver da publicidade”. É da sua autoria o célebre slogan “Há mar e mar, há ir e voltar”, encomendado pelo Instituto de Socorros a Náufragos (Alçada Batista disse que, para esta campanha, O’Neill tinha uma frase tão boa ou melhor, “Passe um Verão desafogado!”).

Em 1946, tornou-se escriturário, na Caixa de Previdência dos Profissionais do Comércio. Permaneceu neste emprego até 1952. A partir de 1957, começou a escrever para os jornais, primeiro esporadicamente, depois assinando colunas regulares no Diário de Lisboa, n’A Capital e, nos anos 1980, no Jornal de Letras.

Em 1953, esteve preso três semanas no Estabelecimento Prisional de Caxias por ter ido esperar Maria Lamas, que regressava do Congresso Mundial da Paz em Viena, passando a ser vigiado pela PIDE. No entanto, sendo um oposicionista, não militou em nenhum partido político, nem durante o Estado Novo, nem a seguir ao 25 de Abril. Foi-se distanciando progressivamente de grupos e tertúlias, mostrando-se cada vez mais mordaz e mais cioso do seu individualismo.

Em 1958, com a edição de “No Reino da Dinamarca”, viu-se reconhecido como poeta. Na década de 1960, provavelmente a mais produtiva literariamente, foi publicando livros de poesia, antologias de outros poetas e traduções.

Os seus textos caracterizam-se por uma intensa sátira a Portugal e aos portugueses, apresentando a mesquinhez da vida e a dor do quotidiano, mas vendo-as sem dramatismos, antes com humor (por vezes contrariado por um tom discretamente sentimental, pelo desespero perante o marasmo do país), parecendo este ser a única forma de se lhes opor.

A sua atração por outros meios de comunicação, que não a palavra escrita, é testemunhada pela letra do fado “Gaivota” destinada à voz de Amália, com música de Alain Oulman, tal como a colaboração em programas televisivos ou em guiões de filmes e em peças de teatro.

Em 1976, sofreu um ataque cardíaco, admitindo então que o mesmo se devera à vida desregrada que sempre tivera e que, apesar de algum esforço em contrário, continuou a ter. Em 1984, sofreu um acidente vascular cerebral, antecipatório daquele que, em Abril de 1986, o levaria ao internamento prolongado no hospital, falecendo em 21 de Agosto.

Recebeu, em 1982 o Prémio da Associação de Críticos Literários e a 10 de Junho de 1990, a título póstumo, foi feito Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada.

 

Consulte aqui a bibliografia.

 

Amigo

Mal nos conhecemos

Inaugurámos a palavra amigo!

 

Amigo é um sorriso

De boca em boca,

Um olhar bem limpo,

 

Uma casa, mesmo modesta, que se oferece.

Um coração pronto a pulsar

Na nossa mão!

 

Amigo (recordam-se, vocês aí,

Escrupulosos detritos?)

Amigo é o contrário de inimigo!

 

Amigo é o erro corrigido,

Não o erro perseguido, explorado.

É a verdade partilhada, praticada.

 

Amigo é a solidão derrotada!

Amigo é uma grande tarefa,

Um trabalho sem fim,

Um espaço útil, um tempo fértil,

Amigo vai ser, é já uma grande festa!

in “No Reino da Dinamarca”

 

Leia aqui outros poemas do autor.

 

MJLeite

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