José Fanha

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Nas suas palavras…

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Nasci no dia 19 de Fevereiro de 1951, no segundo andar de um prédio no meio de Lisboa.

Vivi os meus primeiros anos com a minha avó Berta Emília que me contava muitas histórias, verdadeiras e inventadas, e que me passou o “vício” bom de ler e de escrever. Hoje, passados muitos anos, continuo a precisar de ler e escrever tanto como de ar para respirar.

Estudei dos 10 aos 17 anos no Colégio Militar, um colégio interno. Andava fardado, tinha que marchar de um lado para o outro, e além das aulas normais, fazia muito exercício físico e desporto, e só saía aos fins-de-semana.

 Aí comecei a escrever poesia e a perceber que a poesia era a língua que melhor me permitia falar de mim a mim e aos outros. Foi aí, também, que aprendi o valor da camaradagem e da dignidade que é, ainda hoje, a roupa que melhor me vai ao corpo.           

Com 18 anos, estudava Arquitectura e andava pela rua com o meu bigode comprido e o meu ar de Beatle cabeludo. Comecei, nesse tempo, a olhar à minha volta e percebi que estava a viver num país cinzento e triste, uma ditadura, onde as pessoas não eram livres de falar e cantar e dançar. A polícia prendia pessoas boas e, às vezes, até as torturava só pelas ideias que tinham. A forma que eu tinha de falar e protestar e sonhar era a minha poesia. Com ela às costas, juntei-me, então, a um grupo de cantores (O Zeca Afonso, o Francisco Fanhais, o Manuel Freire, o José Jorge Letria e outros) que cantavam, mais às claras ou mais às escondidas, para juntar pessoas e dizer-lhes que era preciso acabar com a ditadura se queríamos ser livres e um bocadinho mais felizes.

A ditadura acabou no 25 de Abril de 1974 e eu acabei o meu curso de Arquitectura. Mas pouco tempo fui arquitecto. Já tinha 23 anos e ainda não sabia o que é que queria ser quando fosse grande. E ainda hoje só sei que quero continuar a ler e a escrever e que gostava um dia de ser palhaço num circo.

Na minha vida fiz muitas coisas variadas e um bocadinho malucas. Fui jornalista desportivo, desenhador, publicitário, actor, professor, etc. Tornei-me muito conhecido num concurso de televisão muito famoso que se chamava “A visita da Cornélia”. Os concorrentes tinham que representar teatro, cantar, dançar, escrever uma espécie de redacção, etc, etc. Privilegiava-se a criatividade e a cultura. Havia lugar para a poesia e para o humor num espectáculo de tremendo impacto popular. Foi neste concurso que apresentei pela primeira vez um poema intitulado “Eu sou português aqui” que acabou por se tornar numa espécie de hino ao 25 de Abril.

Escrevi textos para rádio, televisão, teatro, ópera e cinema.

Acima de tudo, continuo apaixonado pela poesia e por histórias. Gosto de as escrever e gosto de ir a escolas e bibliotecas para ler poesia e contar histórias, porque a escrever histórias e a poesia nós deitamos cá para fora, e partilhamos com os outros, as nossas dores, os nossos sonhos e as nossas alegrias. E essa partilha é a coisa melhor que há na vida.

Viajar sempre foi uma paixão enorme. Às vezes é preciso sair de cá para nos olharmos de fora e percebermos melhor quem somos. Aqui, em 85, no rijo Inverno holandês, em Amsterdão, uma das cidades mais maravilhosas que conheço e a que gosto de chamar Cidade-de-todos-os-espantos-de-Amsterdão.

Não sou capaz de falar de mim sem os (os seus filhos) trazer também à conversa. Porque eles são a razão de muito do que eu faço. É para eles que guardo a criança que ainda vive dentro do meu peito e que, apesar de alguns tropeções e desgostos, vive sempre a encantar-se com as maravilhosas surpresas que a vida continua a reservar-nos.”

                                      http://www.nonio.uminho.pt  (consultado em 09/02/2016)

 

Já foi professor do ensino secundário e é hoje assessor cultural na Câmara Municipal de Sintra.

Tem dirigido Oficinas de Poesia e de Escrita além de desenvolver trabalho intenso de divulgação de poesia e promoção do livro e da leitura em Bibliotecas e escolas um pouco por todo o país.

É mestre na área de Educação e Leitura pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa (2007) e doutorando na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa na área de História da Educação e da Cultura Escrita.

 

Consulte aqui a bibliografia.

 

Romance ingénuo de duas linhas paralelas

 

Duas linhas paralelas,

muito paralelamente,

iam passando entre estrelas

fazendo o que estava escrito:

caminhando eternamente

de infinito a infinito.

 

Seguiam-se passo a passo

exactas e sempre a par

pois só num ponto do espaço,

que ninguém sabe onde é,

se podiam encontrar,

falar e tomar café.

 

Mas farta de andar sozinha,

uma delas certo dia

voltou-se para a outra linha,

sorriu-lhe e disse-lhe assim:

«Deixa lá a geometria

e anda aqui para o pé de mim…»

 

Diz a outra: «Nem pensar!

Mas que falta de respeito!

Se quisermos lá chegar,

temos de ir devagarinho,

andando sempre a direito

cada qual no seu caminho!»

 

Não se dando por achada

fica na sua a primeira

e sorrindo amalandrada,

pela calada, sem um grito,

deita a mãozinha matreira,

puxa para si o infinito.

E com ele ali à frente,

as duas a murmurar

olharam-se docemente,

e sem fazerem perguntas,

puseram-se a namorar,

seguiram as duas juntas.

 

Assim, nestas poucas linhas

fica uma estória banal

com linhas e entrelinhas

e uma moral convergente:

o infinito afinal

fica aqui ao pé da gente.

 

 

Leia aqui outros textos do autor.

 

MJLeite

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