Sarrazola – história na 1ª pessoa

Todos sabemos que uma recordação errada, se for repetida sistematicamente, ou uma mentira, contada muitas vezes, passa a ser verdade, pelo menos até aparecer alguém que comprove uma versão diferente da mesma certeza.

Enquanto a memória não me atraiçoa, deixo aqui este singelo registo, com imagens e texto, para a elaboração da nossa História, até que a minha versão da verdade seja contestada.

 J.M.L.

1 – O Painel

Cheguei a esta escola em 1983, chamava-se “Escola Preparatória de Colares”, leccionava-se cá o Ciclo Preparatório (5º e 6º anos –preparatórios para o nível de ensino seguinte), mas também já havia turmas do Secundário, que na altura eram o 7º, o 8º e o 9º anos. Suponho que se chamava Secundário, por se seguir ao Ensino Primário (que actualmente é o 1º Ciclo), tendo de permeio o tal Ciclo que está na origem do nome da escola e que mais tarde se viria a designar como 2º. O actual ensino secundário (10º,11º e 12º anos), chamava-se Complementar (era complementar, tanto para concluir, como para prosseguir os estudos).

O Secundário (cujo “S” viria, depois, a fazer parte do nome da escola), também tinha a designação de Unificado. Quando deixou de haver distinção entre o Liceu e as Escolas Técnicas, o ensino foi unificado, passando a incluir as disciplinas práticas, a que se chamou Trabalhos Oficinais, que não existiam no ensino liceal.

A escola tinha acabado de se mudar das velhas instalações da Quinta da Sarrazola, que muito mais tarde viria a ser a EPAV, para os novos pavilhões, onde, pela primeira vez, já cabiam todas as turmas, pois algumas tinham ficado lá em cima, enquanto a obra se concluía cá em baixo.

Mal o ano lectivo começou, choveu torrencialmente, o que provocou inundações e enxurradas por quase todo o país. Uma parte da encosta deslizou para dentro da escola, que foi encerrada durante duas semanas, enquanto se procedeu à limpeza.

Naquela época, as turmas do Secundário tinham, nos Trabalhos Oficinais, as áreas de Electrotecnia, Olaria e Têxteis.

No ano lectivo seguinte pensou-se em criar um painel de azulejos para identificar a escola, que deveria ser colocado na parede logo à entrada, na mais visível do exterior. O projecto seria feito na minha aula de Educação Visual e depois de pronto, passaria para a de Olaria, envolvendo os alunos do 7º e 8º anos. Já era trabalho colaborativo e, na História da nossa escola, ainda estávamos na Antiguidade.

Dos esboços feitos pelos alunos, escolheu-se um que incluía parte do contorno de Portugal, mais o do Concelho de Sintra e as palavras “Escola Preparatória de Colares”. Ultrapassada a fase criativa, para o trabalho ficar em condições teve de ser, primeiro redesenhado por mim e depois pelos alunos com as minhas instruções rigorosas. Cada aluno desenhou parte deste painel, que tem cerca de 100 azulejos com desenhos, para além dos que apenas têm só uma cor, que foram tratados apenas na aula de Olaria. No total são 255 azulejos, sem incluir a cercadura. Seguem-se imagens do Antes e Depois.

 

Foram feitos estudos para as letras, desde o rascunho, ao positivo e negativo:

Tal como para o mapa, cercadura e cores:

Depois de prontos, na aula de E.V., os trabalhos seguiram para a de Olaria, assim como os esquemas com cores e anotações:

Nesta fase, deixei de acompanhar o desenvolvimento do trabalho, mas não o deveria ter feito, mais adiante veremos porquê. Sei que na aula de Olaria se fizeram vários testes para ensaiar a cor –depois de cozido e vidrado, o azulejo pode ficar com um tom muito diferente do pretendido–, assim como para os traços dos desenhos, que tinham de ser feitos com pincel sobre o azulejo.

As letras tinham sido desenhadas em quadrados de papel vegetal com a dimensão dos azulejos, mas, para poupar trabalho e tempo, as repetidas não foram desenhadas, embora a folha com cada uma, tivesse as instruções correspondentes, pois o “s” da palavra “Escola”, também entrava no fim da palavra “Colares; a letra “o” entra em “Escola”, em “Preparatória” e em “Colares” e assim por diante para todas as que se repetem.

A minha intervenção neste trabalho ficou concluída com o desenho, à escala, da parede, onde eram indicadas as dimensões do painel e a sua localização, para que a equipa que o colocou, o deixasse na altura exacta. A enxurrada do ano anterior deixara o corredor que rodeava o Pavilhão “A” com lama até à altura do muro. Assim, se isso voltasse a acontecer, só a parte inferior da cercadura ficaria coberta. Para além disto, o painel não poderia ultrapassar, em altura, o nível onde se encontrava o cabo eléctrico da lâmpada que o iluminaria durante a noite.

As fiadas de azulejos foram sendo colocadas, de baixo para cima, sem que eu assistisse à obra.

Quando ficou pronta e seca, é que me apercebi que o “fenómeno das letras repetidas” tinha deixado uma marca indelével. Alguém se tinha enganado e repetiu o “c” minúsculo de “Escola” na palavra “colares”.

Grande bronca, colares com minúscula são para usar ao pescoço, Colares com maiúscula é outra coisa. Assim até parece uma escola onde os colares são preparados…

Se fosse uma moeda, ou selo de colecção, o facto de ter um defeito só iria valorizar a peça, mas tratando-se de um exemplar único, é realmente um grande lapso.

Mas, talvez ninguém se tenha apercebido disto, pois não sabiam se este tipo de letra tem “C” maiúsculo ou não. Com alguma atenção percebe-se que o “E” de escola é diferente dos que estão nas outras palavras; “Preparatória” tem duas vezes a letra “p”, uma minúscula e outra maiúscula, portanto, faria todo o sentido que “Colares” tivesse maiúscula.

Trata-se de trabalho artesanal e amador, tinha de ter algum defeito. Mas ainda há outro, descrito abaixo.

As imagens seguintes mostram o painel completo e o canto onde se encontra a data (1984/85).

Durante os anos que se seguiram, não só a escola foi mudando de nome, como o painel foi servindo de alvo para as pedradas de alguns alunos, uma delas até conseguiu acertar no pequeno círculo branco (que assinalaria a localização de Colares no mapa, se tivesse sido colocado no sítio certo, mas ficou uma casa para a esquerda), por baixo do “P”. Compare-se o desenho com a foto.

Lição a reter: Nos trabalhos de responsabilidade, não se pode confiar em ninguém.

Foi com admiração que me apercebi, durante a demolição para as obras da escola nova, que o painel e parte da parede que o suporta, tinham ficado onde estavam. Segundo o nosso Director, a arquitecta, autora do projecto, resolvera adaptar a planta, de forma a deixar o painel a marcar a entrada da escola.

Aqui está, durante a obra e já com ela acabada.

Colocaram-lhe uma moldura metálica de remate, mas, à boa maneira portuguesa, ficou descentrada. Repare-se que a margem esquerda da cercadura preta ficou só com metade de largura visível.

Quem nasce torto….

2 – Os Logótipos

O primeiro é de 1983/84, da autoria de Nuno Miguel Duarte Tavares, do 8ºB. A escola era ainda EPC e o meu retoque foi apenas para adaptar as letras à curvatura das folhas do livro aberto.

No segundo, baseado no primeiro, limitei-me a colocar as letras “C+S” no lugar do “P”.

Em 1985 a escola passara a ser C+S [Ciclo (preparatório) + Secundário (7º, 8º e 9º anos)].

Ambos fizeram parte das capas dos Regulamentos Internos, que eu tinha ajudado a elaborar.

A partir de 1990 a escola passou a incluir também o Secundário actual, primeiro só o 10º ano e depois os seguintes, mas só em 1993 é que o nome foi alterado para “Escola da Sarrazola”.

Em 1993/94 tentou-se fazer um concurso para o novo logótipo, mas não apareceram trabalhos em condições, porém, no ano seguinte, os alunos fizeram-no na aula, em vez de ter sido em casa, como no ano anterior e apareceram desenhos muito bons. Então foi possível fazer um concurso. O vencedor foi Marco Paulo Filipe, do 9ºC, actualmente já licenciado em Farmácia, há alguns anos.

Segue-se o trabalho escolhido e a versão colorida em desenho vectorial que elaborei a seguir.

Mais tarde formou-se o Agrupamento, para o qual criei a imagem abaixo, que trabalhei a partir de uma fotografia. Este logótipo manteve-se em uso com o da Sarrazola, um para a Escola, outro para o Agrupamento. Nalguns documentos apareciam os dois.

Até que a Escola teve de optar, ou ficava com o nome do Agrupamento, ou o Agrupamento ficava com o nome da Escola, a não ser que existisse um patrono, que não existia. Por razões óbvias, o Agrupamento não podia ser “Da Sarrazola”, que é só aqui e não desde as Azenhas à Azóia, passando por Galamares.

Começou aquilo a que, por vezes, chamo “o Culto do Farol”, com a Escola a perder gradualmente a imagem da identidade. Passou a chamar-se “Básica de Colares”, tal como a do 1º ciclo, embora a nossa seja 2,3. 

A Direcção da Escola lançou então um concurso a nível do Agrupamento, onde toda a gente deve ter votado.

Foi vencedor o trabalho da minha colega Ana Garcez, apresentado aqui em baixo, ao lado da minha versão vectorial. Deste trabalho existe uma alternativa ligeiramente diferente, apenas a preto-e-branco, que todos devemos conhecer.

Quanto ao futuro, o farol, mesmo com as versões humanizadas que o meu colega Daniel Silva elaborou para as escolas do 1º ciclo e Jardins de Infância, o Sarramelo e o seu alter-ego Super Melo (este também do Daniel), são concorrente ferozes, que muito alunos associam à imagem da nossa escola. Até há quem diga que o “S” do capacete do Super Melo é de Sarrazola…

Aqui ficam eles para finalizar este texto.

 

Desta vez não indico bibliografia, usei a memória, parte dos textos dos meus relatórios para mudança de escalão e imagens do meu arquivo.

Por   José Maria Silva

5 comentários para “Sarrazola – história na 1ª pessoa”

  1. Frequentei esta escola nos anos 80, a qual me traz muitas recordações! E passei por essa fase de transição do prédio antigo para o estabelecimento composto por vários pavilhões! Na altura tinha a designação de C+S e participei no Jornal da Escola com alguns desenhos!

  2. Fui uma de entre muitos alunos que participou na construção do painel, nas aulas de olaria, com a professora Mariazinha… também fui uma de entre muitos que “estreou” a escola. Passaram uns bons anos e a minha filha foi uma de muitos alunos que “estreou” a nova escola…como antiga aluna e como mãe fiquei muito contente por ver que o painel foi preservado …afinal faz parte da história de alguns de nós, que fomos alunos e agora somos pais, espero que os meus filhos guardem com tão boas memórias desta escola, como eu ainda hoje as guardo.
    Parabéns e obrigada…

  3. Bom dia,
    É muito bom recordar a escola ao longo do tempo.
    Estudei, trabalhei e já tenho 1 filho nessa escola e de facto a evolução faz parte do ser humano, tal como a recordação.

    Voltar a visualizar as imagens da “velha” escola faz bem à alma, lembra-me os bons momentos que passei nesse meio, como aluna e como funcionária.

    Parabéns a esta fantástica idéia de bem resumir o percurso da Escola da Sarrazola e que este percurso continue no progresso, mas mantenha o Humanismo que sempre existiu no seio escolar.

    Mais uma vez

    PARABÉNS

  4. Amigo Zé, o teu testemunho ilustra de forma sublime como a tua história pessoal se mistura e interliga com a história da nossa escola. Isso é uma prova de entrega, de dedicação e de empenho em fazer da Sarrazola uma escola melhor.

    Alguém com um passado e um percurso como o teu na escola, poderia ficar à sombra do peso dos anos, dos cargos desempenhados e do estatuto de “titular”. Mas tu não és assim, ajudas, desenrascas, entregas, colaboras, mesmo com os “suplentes” que chegaram ontem à escola. Louvo a tua incapacidade de dizer “Não posso”.

    Quanto ao Sarramelo, na qualidade de pai adoptivo, fico muito contente que a mascote do Eco Escolas seja já um símbolo da nossa escola.

  5. Fantástico…a memória das coisas faz de nós Homens melhores e mais lúcidos! Sem o respeito pelo passado não existe um futuro decente. Um grande testemunho.

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