Escritores e Poemas: Cecília Meireles
Poetisa, pintora, professora e jornalista brasileira, é considerada uma das vozes líricas mais importantes das literaturas de língua portuguesa.
Nas suas palavras:
“Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno.
(…) Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou o sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento mesmo da minha personalidade.
(…) Minha infância de menina sozinha deu-me duas coisas que parecem negativas, e foram sempre positivas para mim: silêncio e solidão. Essa foi sempre a área de minha vida. Área mágica, onde os caleidoscópios inventaram fabulosos mundos geométricos, onde os relógios revelaram o segredo do seu mecanismo, e as bonecas o jogo do seu olhar. Mais tarde foi nessa área que os livros se abriram, e deixaram sair suas realidades e seus sonhos, em combinação tão harmoniosa que até hoje não compreendo como se possa estabelecer uma separação entre esses dois tempos de vida, unidos como os fios de um pano.”
Tendo escrito o seu primeiro poema aos 9 anos, deixou-nos uma vasta obra literária. Para aceder a alguns títulos que selecionámos, clique aqui.
Na impossibilidade de aqui os deixar todos, eis dois belíssimos poemas de Cecília Meireles (mas quão difícil foi a escolha!).
Recado aos Amigos Distantes Criança
Meus companheiros amados, Cabecinha boa de menino triste,
não vos espero nem chamo: de menino triste que sofre sozinho,
porque vou para outros lados. que sozinho sofre, – e resiste,
Mas é certo que vos amo.
Nem sempre os que estão mais perto Cabecinha boa de menino ausente,
fazem melhor companhia. que de sofrer tanto se fez pensativo,
Mesmo com sol encoberto, e não sabe mais o que sente…
todos sabem quando é dia.
Pelo vosso campo imenso, Cabecinha boa de menino mudo
vou cortando meus atalhos. que não teve nada, que não pediu nada,
Por vosso amor é que penso pelo medo de perder tudo.
e me dou tantos trabalhos.
Não condeneis, por enquanto, Cabecinha boa de menino santo
minha rebelde maneira. que do alto se inclina sobre a água do mundo
Para libertar-me tanto, para mirar seu desencanto.
fico vossa prisioneira.
Por mais que longe pareça, Para ver passar numa onda lenta e fria
ides na minha lembrança, a estrela perdida da felicidade
ides na minha cabeça, que soube que não possuiria.
valeis a minha Esperança.
in Poemas in Viagem
Maria José Leite
Iniciamos com este artigo uma nova rubrica: Escritores e Poemas. Pensamos ir ao encontro dos amantes das letras e, simultaneamente, desafiar os que estão mais arredados e distraídos das delícias literárias. Numa primeira fase, o Chão de Areia avançará com as suas propostas, posteriormente daremos aos nossos leitores a oportunidade de partilharem os seus tesouros.
FC
Classificado em: Escritores e Poemas, Homenagens, Línguas e Literatura
O Chão de Areia não para de nos surpreender 🙂
Parabéns por este novo espaço.
Mais uma excelente iniciativa do “Chão de Areia”. E que dizer do começo desta nova rubrica. Excelente momento de reflexão e leitura. Obrigado.