Almeida Garrett


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João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett e mais tarde 1.º Visconde de Almeida Garrett foi escritor e dramaturgo romântico, orador, par do reino, ministro e secretário de estado honorário português.

Os seus pais refugiaram-se em Angra, como consequência da invasão francesa de Soult, em 1809, onde o escritor recebeu a influência benéfica do seu tio paterno, o bispo D. Frei Alexandre da Sagrada Família, tendo recebido Ordens Menores e tendo mesmo, aos 15 anos, subido ao púlpito numa igreja da Graciosa, em substituição do pregador.

Matriculado em 1816 na Faculdade de Direito de Coimbra, em breve se dedicou à atividade dramática num meio académico agitado pelas novas ideias, sobretudo políticas.

Concluído o curso, em 1821 (ano em que termina O Retrato de Vénus), veio para Lisboa, onde imediatamente acumulou triunfos, literários e políticos.

Exilado como liberal em 1823, após a Vilafrancada, viveu em Inglaterra e foi aí que  tomou contacto com o movimento romântico, descobrindo Shakespeare, Walter Scott e outros autores e visitando castelos feudais e ruínas de igrejas e abadias góticas, vivências que se refletiriam na sua obra.

A vitória do Liberalismo permitiu-lhe regressar a Portugal, após curta estadia em Bruxelas como cônsul-geral e encarregado de negócios. Em Portugal exerceu cargos políticos, distinguindo-se como um dos maiores oradores nacionais.

Passos Manuel, na chefia do Governo após a Revolução de Setembro de 1838, encarrega-o da restauração do teatro português, missão que leva a cabo criando não só o Conservatório de Arte Dramática, mas também a Inspeção-Geral dos Teatros e sobretudo o Teatro Nacional. Mais do que construir um teatro, Garrett procurou sobretudo renovar a produção dramática nacional segundo os cânones já vigentes no estrangeiro.

Com a vitória cartista e o regresso de Costa Cabral ao governo, Almeida Garrett afasta-se da vida política até 1852. Contudo, em 1850 subscreveu, com mais de 50 personalidades, um protesto contra a proposta sobre a liberdade de imprensa, mais conhecida por “lei das rolhas”.

D. Pedro V agraciou-o, a 25 de Junho de 1854, meses antes da sua morte, com o título de Visconde de Almeida Garrett.

A vida de Garrett foi tão apaixonante quanto a sua obra. Revolucionário nos anos 20 e 30, distinguiu-se posteriormente sobretudo como o tipo perfeito do dândi, ou janota, tornando-se árbitro de elegâncias e príncipe dos salões mundanos. Foi um homem de muitos amores. Separado da esposa, Luisa Midosi, com quem se casou, em 1822, quando esta tinha 15 anos de idade, viveu depois com D. Adelaide Pastor até a morte desta, em 1841.

A partir de 1846, a sua musa foi a viscondessa da Luz, Rosa Montufar Infante, dama andaluza casada com um oficial do exército português, inspiradora dos arroubos românticos das Folhas caídas.

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Este Inferno de Amar

Este inferno de amar – como eu amo! –
Quem mo pôs aqui n’alma… quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida – e que a vida destrói –
Como é que se veio a atear,
Quando – ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez… – foi um sonho –
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar…
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei… dava o sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? – Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei…

                                                         

Os Cinco Sentidos

São belas – bem o sei, essas estrelas,
Mil cores – divinais têm essas flores;
Mas eu não tenho, amor, olhos para elas:
Em toda a natureza
Não vejo outra beleza
Senão a ti – a ti!

Divina – ai! sim, será a voz que afina
Saudosa – na ramagem densa, umbrosa.
será; mas eu do rouxinol que trina
Não oiço a melodia,
Nem sinto outra harmonia
Senão a ti – a ti!

Respira – n’aura que entre as flores gira,
Celeste – incenso de perfume agreste,
Sei… não sinto: minha alma não aspira,
Não percebe, não toma
Senão o doce aroma
Que vem de ti – de ti!

Formosos – são os pomos saborosos,
É um mimo – de néctar o racimo:
E eu tenho fome e sede… sequiosos,
Famintos meus desejos
Estão… mas é de beijos,
É só de ti – de ti!

Macia – deve a relva luzidia
Do leito – ser por certo em que me deito.
Mas quem, ao pé de ti, quem poderia
Sentir outras carícias,
Tocar noutras delícias
Senão em ti! – em ti!

A ti! ai, a ti só os meus sentidos
Todos num confundidos,
Sentem, ouvem, respiram;
Em ti, por ti deliram.
Em ti a minha sorte,
A minha vida em ti;
E quando venha a morte,
Será morrer por ti.

 

Rosa sem Espinhos

Para todos tens carinhos,
A ninguém mostras rigor!
Que rosa és tu sem espinhos?
Ai, que não te entendo, flor!

Se a borboleta vaidosa
A desdém te vai beijar,
O mais que lhe fazes, rosa,
É sorrir e é corar.


E quando a sonsa da abelha,
Tão modesta em seu zumbir,
Te diz: «Ó rosa vermelha,
Bem me podes acudir:

Deixa do cálix divino
Uma gota só libar…
Deixa, é néctar peregrino,
Mel que eu não sei fabricar …»

Tu de lástima rendida,
De maldita compaixão,
Tu à súplica atrevida
Sabes tu dizer que não?

Tanta lástima e carinhos,
Tanto dó, nenhum rigor!
És rosa e não tens espinhos!
Ai !, que não te entendo, flor

in “Folhas Caídas”

 

MJLeite

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