Ruy Cinatti
Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes nasceu em Londres, a 8 de Março de 1915, regressando a Portugal ainda criança. Foi poeta, antropólogo e agrónomo, tendo estudado no Instituto Militar dos Pupilos do Exército, no Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa e na Universidade de Oxford,
Em 1946 foi nomeado secretário de gabinete do governador de Timor, Óscar Ruas, quatro anos após a violenta invasão japonesa do território, e um ano mais tarde foi autorizado a percorrer livremente Timor, orientado por autóctones, a fim de elaborar um levantamento fitogeográfico que integraria a sua tese de licenciatura.
Em 1951 regressou a Timor, como chefe dos Serviços de Agricultura. Cada vez mais ligado ao território e ao seu povo, Cinatti acreditava que um desenvolvimento agrícola sustentável de Timor só seria possível numa articulação íntima com a cultura local e o respeito pela conservação das florestas. Em 1956, de regresso a Lisboa, Cinatti publicou o manifesto “Em favor do Timorense” e dois anos mais tarde entregou às autoridades um “Plano de Fomento Agrário para Timor”.
Entretanto fixou-se em Oxford, onde preparou uma tese de doutoramento no domínio da antropologia social. Em 1961 regressou a Timor para recolher elemento para a tese e anotou, chocado, a delapidação em curso do património cultural do território. Datam dessa visita 6.000 metros de filme. A sua última viagem decorreu em 1966.
Em Janeiro de 1975 dirigiu uma longa carta ao Diário de Notícias, prevenindo o país do perigo que Timor corria, mas a carta nunca foi publicada e a invasão indonésia foi para ele um rude golpe.
Foi co-fundador de Os Cadernos de Poesia (1940) que, sob o lema “Poesia é só uma”, apresentava como objetivo “arquivar a actividade da poesia actual sem dependência de escolas ou grupos literários, estéticas ou doutrinas, fórmulas ou programas”. Foi nas edições “Cadernos de Poesia” que publicou as suas primeiras obras poéticas: “Nós Não Somos deste Mundo”, em 1941, e, no ano seguinte, “Anoitecendo a Vida Recomeça”.
Devido ao seu trajeto profissional e a uma personalidade que recusou integrar qualquer tipo de grupos ideológicos ou literários, a poesia de Ruy Cinatti possui uma voz própria, nascida de uma liberdade métrica e lexical total, que consegue integrar na obra poética materiais tradicionalmente não poéticos, com uma particular relação com espaços e populações, de cuja fragilidade o poeta tem consciência, o que lhe motiva composições de revolta e de grande intensidade emocional.
Pela sua atividade como escritor e poeta, Ruy Cinatti foi agraciado com vários prémios:
- Prémio Antero de Quental (1958)
- Prémio Nacional de Poesia (1968)
- Prémio Camilo Pessanha (1971)
- Prémio P.E.N. Clube Português de Poesia (1982)
Ruy Cinatti veio a falecer em Lisboa, no dia 12 de Outubro de 1986, deixando os seus bens e espólio literário à Casa do Gaiato, de Lisboa.
A 10 de Junho de 1992, recebeu, a título póstumo, a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
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Tau Matan Ba Timor
Hei de chorar as praias mansas de Tíbare Díli,
as manhãs, mesas de bruma, de Lautém,
os horizontes transmarinhos de Dáre,
as planícies agrícolas de Same e de Suai.
Ruy Cinatti, Timor-Amor
Vínculo Timorense
Praia presa, adiantada
no mar, no longe, no círculo
de coral que o mar represa.
Praia futura invocada.
Timor ressurge das águas,
praia futura invocada.
Molho o meu sangue na alma
da bandeira que mais prezo,
porque tenho nela a voz
da minha candeia acesa.
Sou transparente ao luar
da minha candeia acesa.
Senhor da terra, das águas,
do ar e dos milheirais.
Senhor Mãe e Senhor Pai,
dai-me um desejo profundo.
Que eu seja senhor de mim!
Dai-me um desejo profundo.
De monte a monte, o meu grito
soa, soa, como voz
de um eco do infinito
ecoando em todos nós.
Timor cresce como um grito
ecoando em todos nós.
«A BOCA EMUDECE, A VOZ APAGA-SE»
Um Cancioneiro para Timor
Disponibilidade
Vem ver a vida
Passear silenciosamente
Como a ave no ar claro.
Vê-a que desce. Prende-a.
Nas tuas mãos em concha
Fica um instante.
Deixa-a fugir. Outras há.
O Livro do Nómada Meu Amigo,
Maria José Leite
Classificado em: Escritores e Poemas