Mia Couto

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“O mar foi ontem o que o idioma pode ser hoje, falta vencer alguns Adamastores”.

A sua paixão por gatos e a dificuldade do irmão mais novo em pronunciar “Emílio” (de António Emílio Leite Couto) levaram-no a adotar o nome de Mia Couto (segundo o autor, o que era uma forma de tratamento íntimo entre os familiares assumiu-se como assinatura literária devido ao fascínio que sempre demonstrou pelos gatos e que o levava a dizer à família que queria ser como um desses felinos; poderemos presumir que terá nascido deste seu desejo o protagonista de O gato e o escuro, obra que marca oficialmente a sua estreia na produção literária para crianças).

 Filho de poeta, também ele foi um criador de histórias ainda durante a infância. Sabe contar para os miúdos porque já contava enquanto miúdo. É assim que descreve a sua primeira criação literária:

           Tinha cinco anos e os meus pais gravaram num desses aparelhos de fita. A história era a de um leão que atacava pessoas e que se curavam graças a um remédio que inventavam chamado intelentismo. Recordo-me que, nessa altura, usei palavras que nem eu nem meus pais conheciam. Como essa de intelentismo. No final, eles perguntavam-me, e isso está gravado também, onde eu havia escutado tais palavras. E eu respondia que era inglês mas que ninguém, nem os ingleses, sabiam o que queriam dizer tais palavras. A criança tem a vantagem de estrear o mundo, iniciando outro matrimónio entre as coisas e os nomes. 

Apenas com catorze anos de idade teve alguns poemas publicados no jornal Notícias da Beira e três anos depois, em 1971, mudou-se para Lourenço Marques (agora Maputo). Iniciou os estudos universitários em Medicina, mas abandonou esta área no princípio do terceiro ano, passando a exercer a profissão de jornalista depois do 25 de abril de 1974. Trabalhou na “Tribuna” até à destruição das suas instalações em setembro de 1975, por colonos que se opunham à independência. Foi nomeado diretor da Agência de Informação de Moçambique (AIM) e formou ligações de correspondentes entre as províncias moçambicanas durante o tempo da guerra de libertação. Trabalhou depois como diretor da revista “Tempo” até 1981 e continuou a carreira no jornal Notícias até 1985.

Em 1983, publicou o seu primeiro livro de poesia, Raiz de Orvalho. Em 1985, decide continuar os estudos universitários de Biologia, terminando o curso em 1989, na área de Ecologia. Dirige hoje a empresa Avaliações de Impacto Ambiental e é também professor da cadeira de Ecologia em diversos cursos da Universidade Eduardo Mondlane.

Considerado um dos escritores mais importantes de Moçambique, é o escritor moçambicano mais traduzido. Em muitas das suas obras, Mia Couto tenta recriar a língua portuguesa com uma influência moçambicana, utilizando o léxico de várias regiões do país e produzindo um novo modelo de narrativa africana.

Terra Sonâmbula, o seu primeiro romance, publicado em 1992, ganhou o Prémio Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos em 1995 e foi considerado um dos dez melhores livros africanos do século XX; em 1999, recebeu o Prémio Vergílio Ferreira, pelo conjunto da sua obra; em 2001, foi distinguido com o Prémio Mário António, pelo livro O último Voo do Flamingo; em 2007, foi-lhe concedido o Prémio União Latina de Literaturas Românicas; em 2012, recebeu o Prémio Eduardo Lourenço 2011; em 2013 foi homenageado com o Prémio Camões, que lhe foi entregue a 10 de Junho no Palácio de Queluz pelas mãos do presidente de Portugal Cavaco Silva e da presidente do Brasil, Dilma Rousseff.  

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A Demora

O amor nos condena:

demoras

mesmo quando chegas antes.

Porque não é no tempo que eu te espero.

 

Espero-te antes de haver vida

e és tu quem faz nascer os dias.

 

Quando chegas

já não sou senão saudade

e as flores

tombam-me dos braços

para dar cor ao chão em que te ergues.

 

Perdido o lugar

em que te aguardo,

só me resta água no lábio

para aplacar a tua sede.

 

Envelhecida a palavra,

tomo a lua por minha boca

e a noite, já sem voz

se vai despindo em ti.

 

O teu vestido tomba

e é uma nuvem.

O teu corpo se deita no meu,

um rio se vai aguando até ser mar.

                                                      Mia Couto, in ” idades cidades divindades”

 

Outros poemas e citações de Mia Couto aqui.

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MJLeite

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