Urbano Tavares Rodrigues

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“Não andei pela vida sozinho. Gostei das pessoas, detestei algumas, ainda hoje detesto, as que se nutrem do suor e da morte de criaturas que para elas são apenas números”.

Nascido em Lisboa em 1923, Urbano Augusto Tavares Rodrigues passou a infância no Alentejo, na herdade da família, o Monte da Esperança, perto de Moura. O contacto com a Natureza alentejana e a perceção da exploração de que era objeto a gente mais humilde influenciaram a sua vida e obra (…comecei a tactear a vida, a dar pela injustiças sociais mesmo ao meu lado, a crescer entre cheiros e sons, visões, bem diferentes, mas misturadas, do paraíso e do inferno. Sentimentos em guerra nasciam dentro de mim e aos meus momentos contemplativos do fim do dia, após as horas de estudo ou os passeios pela beira do Ardila, a pé ou a cavalo, sucediam-se interrogações sem resposta. Deixara de acreditar nos mitos cristãos e procurava outras crenças, outros valores…).

Feita a instrução primária em Moura, matriculou-se no Liceu Camões, em Lisboa, onde foi colega de Luís Lindley Cintra. Concluídos os estudos liceais, ingressou na Faculdade de Letras de Lisboa, vindo a licenciar-se em Filologia Românica, em 1949, com a tese “Manuel Teixeira Gomes: Introdução ao Estudo da sua Obra”, sob orientação de Jacinto do Prado Coelho.

Entre 1949 e 1955, foi professor de Língua, Literatura e Cultura Portuguesas em Montpellier, Aix-en-Provence e Paris. Na capital francesa, relacionou-se com grandes vultos das letras francesas, destacando-se Jean-Paul Sartre e Albert Camus.

De regresso a Portugal, a par da atividade literária, dedicou-se ao jornalismo, ao serviço do “Diário de Lisboa”, fazendo diversas viagens ao estrangeiro como repórter, das quais resultariam crónicas de viagens reunidas em livros. Em 1957, foi nomeado assistente da Faculdade de Letras de Lisboa, cargo de que seria destituído, dois anos mais tarde, por ter apoiado a candidatura do General Humberto Delgado nas eleições presidenciais de 1958. Para garantir o seu sustento e o da família (casara, em 1949, com a escritora Maria Judite de Carvalho de quem tinha uma filha, a  escritora Isabel Fraga), retomou a atividade jornalística, como redator e crítico literário e teatral, lecionando no Colégio Moderno e no Lycée Français Charles Lepierre.

O seu envolvimento em sucessivas ações de luta contra o Estado Novo, a militância na resistência ao lado do Partido Comunista Português (ao qual aderiu em 1969) valeram-lhe a perseguição da PIDE, livros apreendidos e a prisão em 1961, 1963 e 1968.

Em Outubro de 1974, por proposta de Luís Lindley Cintra, foi reintegrado no corpo docente da Faculdade de Letras de Lisboa, onde se veio a doutorar em 1984 com uma nova tese sobre Manuel Teixeira Gomes (“Manuel Teixeira Gomes: O Discurso do Desejo”), jubilando-se em 1993, mas continuando a exercer a docência na Universidade Autónoma de Lisboa Luís de Camões.

Depois do 25 de Abril, aquando da Reforma Agrária, em coerência com o seu ideário e com o lema “a terra a quem a trabalha”, despojou-se das suas propriedades no Alentejo. Em entrevista a Luís Leal Miranda, em 2010, afirmou “Foi um gesto romântico, separei-me de uma casa à qual tinha um amor profundo. Se não fosse isso era hoje um homem rico. Mas não quero saber. Fiz aquilo que achava certo e coerente com as minhas convicções.»

Um dos mais prestigiados escritores da segunda metade do século XX em Portugal, a sua obra, traduzida em diversas línguas, conta com dezenas de títulos, entre conto, romance, crónica e ensaio. Paralelamente, colaborou em diversas publicações periódicas, como “Bulletin des Études Portugaises”, “Colóquio”, “Colóquio/Letras”, “Cosmos”, “Estudos Italianos em Portugal”, “Europa”, “Gazeta Musical e de Todas as Artes”, “Letras e Artes”, “Suplemento Cultural” (do jornal “O Diário”), “Vértice”, “Vida Literária” (suplemento do “Diário de Lisboa”), “JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias”, “Nouvel Observateur”, “Seara Nova”, “Prelo”. Foi ainda presidente da Associação Portuguesa de Escritores, entre 1980 e 1982) e membro da secção portuguesa do PEN Club, da Associação Internacional dos Críticos Literários, da Associação Portuguesa de Literatura Comparada, da Academia das Ciências de Lisboa, da Academia Brasileira de Letras e da Académie Européenne des Sciences, des Arts et des Lettres, além de integrar vários júris de prémios literários.

Prémios ao Autor

– Tributo de Consagração Fundação Inês de Castro, 2007;

– Grande Prémio Vida Literária APE/CGD, 2002;

– Prémio Consagração de Carreira da Sociedade Portuguesa de Autores, 2000.

 

Prémios à Obra

– Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco, 2003, com A estação dourada;

– Prémio Literatura e Ecologia do Lyons Club de Aveiro, 1994, com Deriva;

– Prémio Jacinto do Prado Coelho, 1993, com A horas e desoras;

– Prémio Literário Fernando Namora / Estoril Sol, 1993, com Violeta e a noite;

– Prémio da Crítica da Associação Portuguesa de Críticos Literários, 1986, com A vaga de calor;

– Prémio Aquilino Ribeiro da Academia das Ciências de Lisboa, 1982, com Fuga imóvel;

– Prémio Imprensa Cultural, 1966, com Imitação da felicidade;

– Prémio dos Leitores, 1961, com Nus e suplicantes;

– Prémio Ricardo Malheiros, 1958, com Uma pedrada no charco.

 

Aceda aqui à bibliografia.

 

Mulheres do Alentejo

Mulheres do Alentejo

Com papoilas nos olhos

São primaveras erguidas

Contra os bastões contra as balas

Oculto o rosto

Seus negros chapéus descidos

Frene ao sol

O claro choro nas mãos

Com bagos de amanhã.

São cor de terra

Cor de trabalho

Cor da habituação à dor.

Nossa Pátria do sofrimento

E do valor

Meu sinal de luz

Em toda a palavra que escrevo

Meu território do regresso e do futuro

Minha praia de secura

Percorrida pelo ódio e pelo pânico

Eis o ardente povo torturado

Esperança viva de um sonho feito carne

Mulheres searas fontes azinheiras

Nossa esperança, ainda em flor e fruto

No vermelho das feridas deste País de Abril

 

Leia aqui outros poemas do autor.

 

MJLeite

 

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