Pepetela
“ Um louco se consome pela escrita. Mas há um generoso que o lê e lhe dá vida.”
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos é conhecido por Pepetela, nome que significa “pestana” em quimbundo, que adotou enquanto guerrilheiro do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), mantendo-o como nome literário.
Nasceu em Benguela e aí fez a sua escolaridade primária, concluindo o secundário no Lubango. Em 1958 veio para Lisboa onde frequentou o Instituto Superior Técnico, curso de engenharia, até 1960 (nesta altura teve forte participação em atividades literárias e políticas na Casa dos Estudantes do Império). Pouco depois, mais uma mudança, desta vez para frequentar o curso de Letras apenas durante um ano, pois, ainda em 1961, fez a opção política que viria a mudar o rumo da sua vida e a marcar toda a sua obra, tornando-o um narrador de uma história que conhece, porque a viveu, enquanto militante e guerrilheiro do MPLA.
Por razões políticas, em 1962 partiu para Paris, onde viveu seis meses, seguindo depois para a Argélia, onde se licenciou em Sociologia e trabalhou na representação do MPLA e no Centro de Estudos Angolanos que ajudou a criar.
Integrou a primeira delegação do MPLA que chegou a Luanda em Novembro de 1974.
Desempenhou os cargos de Diretor de Departamento de Educação e Cultura e do Departamento de Orientação Política e, entre 1975 a 1982, foi vice-ministro da Educação.
Depois da sua saída do governo, em 1982, optou pela carreira de docente na Faculdade de Arquitetura, em Luanda, dando aulas de sociologia. Sem abandonar o ensino, dedica-se exclusivamente à escrita.
A sua obra reflete a história contemporânea de Angola e os problemas que a sociedade angolana enfrenta e enfrentou durante a longa guerra. O seu romance “Mayombe” retrata a vida de um grupo de guerrilheiros durante a guerra; “Yaka” segue a vida de uma família colonial na cidade de Benguela ao longo de um século; “A Geração da Utopia” mostra a desilusão existente em Angola depois da independência; “Predadores” faz uma crítica contundente às classes dominantes de Angola.
É membro fundador da União dos Escritores Angolanos. Grande parte da sua obra literária foi publicada após a independência de Angola, sendo alvo de inúmeros estudos em várias universidades e instituições de ensino em Angola e noutros países. As suas obras foram publicadas em Angola, Portugal, Brasil, estando traduzidas em quinze línguas.
Foi galardoado com vários prémios:
– Prémio Nacional de Literatura (1980), “Mayombe;
– Prémio Nacional de Literatura (1985),”Yaka”;
– Prémio Especial dos Críticos de São Paulo (1993), “A Geração da Utopia”;
– Prémio Camões (1997) pelo conjunto da sua obra;
– Prémio Prinz Claus (1999 – Holanda) pelo conjunto da sua obra;
– Prémio Nacional de Cultura e Artes (2002) pelo conjunto da obra.
Consulte aqui a bibliografia.
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Leia este interessante trecho da obra “A Montanha da Água Lilás” que, escrita em 2000, não perdeu atualidade.
No tempo em que os animais falavam existia uma montanha onde habitavam os lupis. Os lupis viviam separados dos outros animais da planície e alimentavam-se dos frutos que colhiam das muitas árvores da montanha. Eram umas criaturas pequenas e rechonchudas, com o corpo coberto de pêlo cor de laranja. Uma espécie de macacos, com características que nos levam a pensar neles como os antepassados longínquos dos Homens.
Os lupis distinguiam-se uns dos outros pela inteligência e pelo tamanho. Os mais inteligentes eram os cambutinhas, os mais pequenos dos lupis, era deles que partiam todas as ideias. Os mais trabalhadores eram os lupões, maiores e menos dados às coisas do pensamento, eram fisicamente mais capazes do que os cambutinhas.
Os lupis viviam felizes, comiam a muita fruta da montanha e viviam pacificamente, sem motivos para discutir. Por um acaso da evolução, algumas das crias lupis começam a crescer mais do que os seus progenitores. Estes novos lupis, para além de serem fisicamente maiores, eram também muito preguiçosos e violentos. Eram completamente incapazes de sobreviver sozinhos, porque não conseguiam subir às árvores para colher fruta e aproveitavam-se da boa vontade dos seus semelhantes para se alimentarem. Não contribuíam em nada para a vida na montanha, a única coisa que sabiam fazer era perturbar a paz na montanha. Por serem tão diferentes dos restantes lupis, começaram a ser chamados de jacalupis, porque até na maneira como expressavam o seu estado de espírito eram diferentes dos outros lupis.
Embora os jacalupis tenham vindo complicar um pouco a vida simples que até aí se vivia na montanha, os lupis foram-se adaptando às novas circunstâncias e aceitaram estes seus semelhantes de forma pacífica.
A vida seguia sem percalços, comiam a fruta das árvores e, os momentos de lazer continuavam a ser passados no vale da poesia em contemplação da natureza.
Um dia, para surpresa de todos, da montanha que habitavam desde que se lembravam, começa a brotar uma espécie de água, de cor lilás e com um perfume inebriante que deixa quem se aproxima dela mais feliz. Os lupis ficam, naturalmente, muito intrigados com a água lilás e os lupis cientistas começam logo a investigar as potencialidades de tão extraordinário líquido. Será que se pode beber? Será que se pode tomar banho nela? Se apenas cheirá-la os deixa tão felizes… O aparecimento de um bem a que mais nenhum animal tem acesso e, ainda por cima, um que parece ter potencialidades infinitas, vai alterar a vida dos lupis para sempre. O lupão comerciante começa logo a conceber planos para rentabilizar o precioso líquido, os jacalupis tornam-se ainda mais violentos e preguiçosos, e o cambutinhas começam a parecer-se cada vez mais com escravos, embora estejam em maioria.
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Leia aqui algumas reflexões do autor.
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MJL
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