Bernardo Santareno

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Escritor e dramaturgo, nasceu em Santarém, onde fez a instrução primária e o liceu. Em 1950, concluiu a licenciatura em Medicina, na área da Psiquiatria, pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Conciliou, durante anos, a atividade de médico com a escrita para teatro, alcançando, desde a sua estreia nos anos sessenta, um papel de primeiro plano no teatro português.

Homem de esquerda, combatente contra o Estado Novo de Salazar, contra a discriminação política, moral, social e sexual, a sua escrita foi essencialmente de denúncia, o que lhe valeu a proibição de algumas das suas peças e a perseguição pelo regime salazarista.

Em 1957, depois da publicação de “A morte na raiz” (1954), “Romance do mar” (1955) e “Os olhos da víbora” (1957), saiu o seu primeiro volume de teatro, reunindo as peças “A promessa”, “O bailarino” e “A excomungada”. A estreia de “A promessa” foi um êxito, mas a representação seria rapidamente suspensa devido a uma campanha desencadeada pelo clero.

Em 1959, para além dum relato de viagem, “Nos mares do fim do mundo: doze meses com os pescadores bacalhoeiros portugueses por bancos da Terra Nova e da Gronelândia, saíram dois novos livros de teatro, tendo o Teatro Nacional D. Maria II apresentado “O lugre” e o Teatro experimental do Porto “O crime da Aldeia Velha”.

A censura impôs a proibição das peças que a seguir escreveu: “António Marinheiro” (1960), “O duelo” e “O pecado de João Agonia” (ambas de 1961) e ainda “Anunciação” (1962).

A partir de 1966, com a obra “O Judeu”, a sua obra mais emblemática, o tom do autor fez-se mais intervencionista. A peça, levada à cena com um êxito memorável em 1981 pelo Teatro Nacional, retrata a via-sacra do dramaturgo setecentista António José da Silva, que pagou com a própria vida o facto de ser judeu e de gostar de escrever peças satíricas que incomodavam a velha igreja ortodoxa, estabelecendo o autor um paralelismo entre a intolerância da Inquisição e a do regime salazarista.

Escreveu ainda “O inferno” (1967), “A traição do Padre Martinho” (1969), e “Português, Escritor, 45 anos de idade” (1974), primeiro texto representado depois da queda da ditadura, no Teatro Maria Matos.

Por fim, o drama “O punho”, escrito no período pós-revolucionário, faz a defesa da reforma agrária e ultimado no ano do falecimento do dramaturgo, encerrou uma produção nem sempre devidamente reconhecida na altura, mas valorizada posteriormente por reinterpretações cénicas inovadoras e por estudos académicos.

Traduziu obras de grandes autores estrangeiros, como André Gide.

Na literatura portuguesa, conhecida pelos seus poetas, pelos seus romancistas ou contistas (mas pouco pelos seus dramaturgos), Bernardo Santareno é considerado o dramaturgo por excelência do século XX português.

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Consulte aqui a bibliografia.

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Desencontro

Jograis e trovadores,

vagabundos de todos os tempos,

são os meus parentes.

Não me peçam construções,

nem actos úteis de momento:

Eu sou um adolescente

e nunca serei adulto.

Não me peçam sobriedade,

nem gestos medidos, cinzentos:

Eu sou um arlequim

e visto-me de encarnado,

como as aves no firmamento

e como as flores na terra!

Não me exijam palavra certa,

nem honra… P’ra quê ilusões?

Nem santo, nem herói, nem mestre:

Eu sou um poeta

e só posso dar canções!

 

MJLeite

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