Almada Negreiros
Escritor e artista plástico, José Sobral de Almada Negreiros nasceu em S. Tomé e Príncipe a 7 de Abril de 1893. Órfão desde tenra idade, viajou para Lisboa com sete anos para casa de uma tia materna. Frequentou os estudos primários e liceais em Lisboa, no Colégio Jesuítico de Campolide, Liceu de Coimbra e Escola Nacional de Lisboa.
Considerado uma das mais singulares e ricas personalidades do mundo cultural português, Almada foi poeta, prosador e pintor e desenvolveu ainda composições coreográficas para ballet, trabalhou em tapeçaria, gravura, pintura mural, caricatura, mosaico, azulejo e vitral.
Foi um dos fundadores da revista Orpheu (1915), veículo de introdução do modernismo em Portugal. Embora já tivesse colaborado com textos e grafismos em algumas publicações, como Portugal Artístico ou Ilustração Portuguesa, e tivesse participado com êxito no 1.º Salão do Grupo dos Humoristas Portugueses, é a sua colaboração no número 1 de Orpheu, onde publica o texto ainda incompletamente revelador Frizos, que lhe dará a base de lançamento para uma postura iconoclasta, tornando-se um dos principais representantes da vertente vanguardista do movimento modernista.
A 21 de Outubro de 1915 estreia-se a peça Soror Mariana de Júlio Dantas, símbolo de uma intelectualidade convencional, burguesa e passadista. Almada reagiu e publicou o Manifesto Anti-Dantas e por extenso. O manifesto não é apenas contra Dantas. É uma reação contra uma geração tradicionalista, uma sociedade burguesa, um país limitado.
“… Basta PUM Basta!
Uma geração, que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi. É um coio d’indigentes, d’indignos e de cegos! É uma resma de charlatães e de vendidos, e só pode parir abaixo de zero! Abaixo a geração!
Morra o Dantas, morra! PIM!”
No fim assina: POETA D’ ORPHEU, FUTURISTA E TUDO.
O Manifesto causa impacto nos meios artísticos, porque afinal há alguém que ousa contestar a cultura instituída, alguém que ousa criticar a sociedade, o País.
Em 1917, participa no projeto Portugal Futurista, publicando nesse órgão do “Comité Futurista de Lisboa”, que co-fundara, no mesmo ano, com Santa-Rita Pintor, o Ultimatum Futurista às Gerações Portuguesas do Século XX, texto que já tinha sido objeto de performance pública, e os textos simultaneístas Mima Fatáxa e Saltimbancos.
A transformação é uma necessidade. É preciso agitar, por vezes provocando. Almada fá-lo no Ultimatum:
É preciso criar a Pátria Portuguesa do séc. XX.
O Povo completo será aquele que tiver reunido no seu máximo todas as qualidades e todos os defeitos. Coragem, Portugueses, só vos faltam as qualidades.
Almada desenvolve paralelamente uma intensa atividade artística, tendo colaborado, com grafismos e com criação literária, em várias publicações, como Diário de Lisboa, Athena, Presença, Revista Portuguesa, Cadernos de Poesia, Panorama, Atlântico, Seara Nova e tendo fundado outras, como os “Cadernos de Almada-Negreiros”, SW, onde, em 1935, no primeiro número, tenta equacionar, com o máximo de clareza, as relações entre civilização e cultura, entre arte e política, entre indivíduo e coletividade, aí vindo também a publicar um dos seus vários textos dramáticos, SOS, que, com Deseja-se Mulher, deveria integrar o projeto, originalmente escrito em castelhano, Tragédia da Unidade.
Entre 1919 e 1920, seguiu estudos de pintura em Paris, aí trabalhando como bailarino de cabaré e empregado numa fábrica de velas, redigindo na capital francesa muitos dos textos e grafismos que viriam a ser célebres, como o “Autorretrato”.
Vulto cimeiro da vida cultural portuguesa durante quase meio século, Almada contribuiu mais que ninguém para a criação, prestígio e triunfo do modernismo artístico em Portugal. Na sua evolução como pintor, Almada passou do figurativismo e da representação convencional dos primeiros tempos, para a abstração geométrica, matemática e numérica que caracteriza as suas últimas obras.
Em 1927 vai para Madrid. Colabora em várias publicações espanholas, Cronica, La Farsa, entre outras. Escreve El Uno, tragédia de la Unidad – obra composta de duas peças que dedica à pintora Sarah Afonso, que há de vir a ser sua mulher.
Ainda em Espanha colabora com arquitetos. Faz murais na Cidade Universitária de Madrid, nos cinemas Barceló e San Carlos e no Teatro Muñoz Seca. Estas duas últimas obras hão de desaparecer durante a guerra.
As duas orientações de busca e criação de Almada Negreiros foram a beleza e a sabedoria. Para ele “a beleza não podia ser ignorante e idiota tal como a sabedoria não podia ser feia e triste”. Almada Negreiros foi um pintor-pensador. Foi praticante de uma arte elaborada que pressupõe uma aprendizagem que não se esgota nas escolas de arte; bem pelo contrário, uma aprendizagem que implica um percurso introspetivo e universal.
Almada Negreiros faleceu a 15 de Junho de 1970 no Hospital de S. Luís dos Franceses, em Lisboa, no mesmo quarto onde morrera o seu amigo Fernando Pessoa.
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“Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa – salvar a humanidade.”
“Eu queria, como tu, não saber que
os outros não valem nada
pra os poder admirar como tu!
Eu queria que a vida fosse tão divinal
como tu a supões, como tu a vives!
Eu invejo-te, ó pedaço de cortiça
a boiar a tona d’água, à merce dos ventos,
sem nunca saber que fundo que é o Mar!”
MJFerreira
Classificado em: Escritores e Poemas