António Aleixo
Considerado um dos mais importantes poetas populares algarvios, famoso pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo é também recordado pela sua simplicidade e humildade, tendo deixado como legado uma obra única no panorama literário português da primeira metade do século XX.
Uma vida de pobreza, com mudanças de emprego, com tragédias familiares e doenças, moldou uma personalidade rica e conhecedora da sociedade do seu tempo.
A viver em Loulé, para onde os pais se mudaram em 1906, aí aprendeu as primeiras letras.
Aprendiz de tecelão, o ofício do pai, foi exercendo o ofício enquanto, simultaneamente, ia de festa em festa como cantador de improvisos, treinando o seu jeito para versejar. Mais tarde, vendendo cautelas e cantando as suas produções pelas feiras portuguesas, ganhou a alcunha de “poeta-cauteleiro”.
Possuidor de uma rara espontaneidade, António inspirava-se nas brincadeiras dirigidas aos amigos mas também na crítica sofrida das injustiças da vida. Compunha e improvisava nas mais diversas situações e oportunidades, umas vezes cantando numa feira ou festa de aldeia, ora aproveitando traços caricaturais de pessoas conhecidas, ora aproveitando uma conversa “mais elevada”. É com um tom dorido (é um homem que tem mulher e filhos para sustentar com um mísero salário e vê definhar, sem possibilidade de lhe garantir a devida assistência, uma filha tuberculosa), irónico e moralista, que conta acontecimentos e julga as ações dos homens.
A sua conhecida obra poética é uma parte mínima de um vasto repertório literário. O poeta nunca teve a preocupação de registar suas composições. Foi com o trabalho de Joaquim de Magalhães, que se dedicou a compilar os versos que eram ditados pelo poeta no intuito de compor o primeiro volume de suas poesias (“Quando Começo a Cantar”), e com o posterior registo do próprio poeta, incentivado por aquele professor, que a obra foi documentada. Refira-se que, antes de Joaquim Magalhães, alguns amigos do poeta lançaram folhetos avulsos com quadras suas, mais com o objetivo de angariar algum dinheiro que ajudasse o poeta na sua situação de miséria do que com a intenção de registar a obra.
A sua primeira obra, “Quando Começo a Cantar”, foi bem acolhida pela crítica. Com uma tiragem de cerca de 1.100 exemplares, o livro esgotou-se em poucos dias, o que proporcionou ao poeta uma pequena melhoria de vida, passando a ser apreciado por inúmeras figuras da sociedade e do meio cultural algarvio.
A 27 de maio de 1944 recebeu o grau de Oficial da Ordem do Mérito.
Em 1943, a tuberculose obrigou ao seu internamento, em Coimbra, no Sanatório dos Covões, onde permaneceu vários anos, com pequenos interregnos para visitas à família, falecendo em 16 de novembro de 1949.
Consulte aqui a bibliografia.
Quadras
O mundo só pode ser
Melhor do que até aqui
Quando consigas fazer
Mais pelos outros que por ti.
Vós que lá do vosso Império
prometeis um mundo novo,
calai-vos, que pode o povo
qu’rer um Mundo novo a sério.
Tu, que tanto prometeste
Enquanto nada podias,
Hoje que podes – esqueceste
Tudo quanto prometias…
Entra sempre com doçura
A mentira, pr’a agradar;
A verdade entra mais dura,
Porque não quer enganar.
Eu não sei porque razão
certos homens, a meu ver,
quanto mais pequenos são
maiores querem parecer.
Mentiu com habilidade,
fez quantas mentiras quis,
Agora fala verdade,
ninguém crê no que ele diz.
Embora os meus olhos sejam,
os mais pequenos do Mundo
O que importa é que eles vejam
O que os homens são no fundo.
Leia aqui outros poemas e quadras do autor.
MJLeite
Classificado em: Escritores e Poemas