Jorge de Sena

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Filho único, teve uma infância marcada pelas expectativas do pai, comandante da marinha mercante, que aspirava vê-lo como oficial da Armada, em confronto com a educação musical que a mãe queria dar-lhe.

Concluído o liceu, ingressou em 1937 na Escola Naval, abandonando a Marinha no ano seguinte, facto determinado pelo endurecimento das normas que regiam então a instrução dos cadetes e pela fascização do Estado Novo por ocasião da Guerra Civil de Espanha. A sua passagem pela Armada no momento da luta pela liberdade em Espanha foi uma traumática experiência da sua adolescência que está presente em algumas das suas obras.

Estreou-se na escrita em 1942, com “Perseguição”, acabando por se licenciar em Engenharia Civil, em 1944, pela Universidade do Porto. Trabalhou na Junta Autónoma de Estradas de 1948 a 1959, ano em que partiu para o Brasil, receando perseguições políticas devido ao seu envolvimento numa tentativa de golpe de estado que falhou.

No Brasil, dedicou-se ao ensino da literatura, acabando por se doutorar em Letras na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara (São Paulo), em 1964, obtendo também o diploma de Livre-Docência, tendo para tal de naturalizar-se brasileiro (1963).

Os anos de Brasil (1959-65), os primeiros vividos, como adulto, em liberdade, foram talvez o seu período mais criativo, mas o golpe militar de 1964 e um previsível um regresso ao passado, quer em termos políticos quer em termos de dificuldades económicas, obrigou-o a nova partida, desta feita para os Estados Unidos, com a esposa e os nove filhos.

Nos Estados Unidos, foi professor da Universidade de Wisconsin e da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, na qual, até ao final da vida, ocupou os cargos de diretor do Departamento de Espanhol e Português e do Programa (interdepartamental) de Literatura Comparada. Foi ainda membro da Hispanic Society of America, da Modern Languages Association of America e da Renaissance Society of America.

Nos EUA, a sua atividade foi direcionada quase exclusivamente para os círculos académicos e da emigração (na Califórnia, teve um importante papel no esclarecimento das comunidades portuguesas sobre o 25 de Abril de 1974), mantendo correspondência com outros escritores e intelectuais portugueses e brasileiros, e viajando frequentemente, em trabalho, até à Europa e, em 1972, a Moçambique e Angola, falando de Camões, no IV Centenário de Os Lusíadas.

É com esta vasta experiência que foi construindo a sua obra que, marcada sobretudo pela reflexão humanista acerca da liberdade do Homem, compreende mais de vinte coletâneas de poesia, uma tragédia em verso, uma dezena de peças de teatro, contos, novela e romance, e ainda cerca de quarenta volumes dedicados à crítica e ao ensaio (com relevo para os estudos sobre Camões e Pessoa), à história e à teoria literária e cultural e às artes plásticas, sem esquecer as traduções.

A par da escrita, desenvolveu intensa atividade como conferencista, como crítico de teatro e de literatura, em diversos jornais e revistas, e também como comentador de cinema.

Em 1977, recebeu o Prémio Internacional de Poesia Etna-Taormina.

Foi condecorado com a Ordem do Infante D. Henrique e recebeu postumamente a Grã-Cruz da Ordem de Santiago. Foi homenageado a 10 de Julho de 2008 no Teatro Nacional de São Carlos pela Fundação José Saramago e com o apoio do Ministério da Cultura e da Biblioteca Nacional.

 

Consulte aqui a bibliografia.

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Os paraísos artificiais

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Na minha terra, não há terra, há ruas;

mesmo as colinas são de prédios altos

com renda muito mais alta.

 

Na minha terra, não há árvores nem flores.

As flores, tão escassas, dos jardins mudam ao mês,

e a Câmara tem máquinas especialíssimas para desenraizar as árvores.

 

Os cânticos das aves – não há cânticos,

mas só canários de 3º andar e papagaios de 5º.

E a música do vento é frio nos pardieiros.

 

Na minha terra, porém, não há pardieiros,

que são todos na Pérsia ou na China,

ou em países inefáveis.

 

A minha terra não é inefável.

A vida da minha terra é que é inefável.

Inefável é o que não pode ser dito.

 

Leia aqui outros poemas do autor.

 

MJLeite

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