José Tolentino Mendonça

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“As nossas sociedades ocidentais estão a viver uma silenciosa mudança de paradigma: o excesso (de emoções, de informação, de expectativas, de solicitações…) está a atropelar a pessoa humana e a empurrá-la para um estado de fadiga, de onde é cada vez mais difícil retornar. O risco é o aprisionamento permanente nesse cansaço.”

                                                    in “A Mística do Instante – o tempo e a promessa”

Nascido no Machico, na Ilha da Madeira, passou parte da sua infância em Angola, no Lobito, período do qual diz guardar “ uma sucessão de imagens felizes. Vivíamos praticamente na praia. Era uma pequena comunidade de pescadores madeirenses, com as suas famílias. Tive a sorte de crescer aí. As tradições que marcavam eram madeirenses… mas inscritas naquele território novo e inesquecível. São dessa altura as minhas primeiras leituras, muitas delas feitas através da memória da minha avó que nos contava romances de cor.

Com 11 anos, regressou à Madeira. “Era a terra dos meus pais. Todas as histórias que me tinham sido contadas passavam por aquele lugar. A verdade é que a ilha tem um impacto enorme. É também um universo onírico… Acho que isso ajudou a refazer a vida, sem olhar demasiado para o que se perdeu. A dimensão de insularidade é muito forte, a relação com os elementos, com o mar. A paisagem da Madeira é muito intensa, as montanhas, a beleza da terra… É uma coisa da qual nunca mais nos livramos. A ilha não é o lugar do crescimento, mas sim da exposição radical ao mundo. Aliás, a história da Madeira remete para isso. É um porto, lugar de visita, de passagem, onde a presença do estrangeiro se confunde com a essência da terra. A descrição dos sítios mais espetaculares da ilha foi feita por estrangeiros, no século XVIII. A própria terra é mudada no olhar do outro e isso faz que a experiência da Madeira seja, de facto, uma experiência de universalidade. O Ferreira de Castro dizia que um café do Funchal era a esquina do mundo. A ciência do mundo está ali presente, também nos limites óbvios que uma experiência de insularidade tem.”

Iniciou o estudo de Teologia em 1982 e, já ordenado padre, em 1990, foi para Roma, onde terminou o seu mestrado em Ciências Bíblicas.De regresso a Portugal, ingressou na Universidade Católica Portuguesa, onde foi capelão e lecionou as disciplinas de Hebraico e Cristianismo e Cultura. Aí fez o doutoramento em Teologia Bíblica, tornando-se professor auxiliar. Dirige o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura e a revista Didaskalia, editada pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. Em dezembro de 2011 foi nomeado consultor do Conselho Pontifício da Cultura.

Passou o ano académico de 2011-12, como Straus Fellow, na New York University, integrando uma equipa de investigadores convidados no estudo do tema “Religião e Espaço Público”.

JTM, para quem “A poesia é a arte de resistir ao seu tempo”, tem uma obra poética que muitos reconhecem entre as mais marcantes do panorama atual.  O seu primeiro livro de poesia, “Os Dias Contados”, foi publicado em 1990 e, desde então, tem diversificado a sua obra como poeta, ensaísta e tradutor. No passado mês de novembro recebeu o prémio literário italiano Res Magnae pelo ensaio “A mística do instante – o tempo e a promessa”, sendo o primeiro português a receber este prémio.

Em 2012, foi empossado Vice-Reitor da Universidade Católica Portuguesa. É membro do 5.º mandato do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.

Especialista em Estudos Bíblicos, tem abordado com rigor e criatividade os temas e os textos do cânone cristão, mantendo o diálogo com as interrogações do presente.

   Foi distinguido com:

– o Prémio Cidade de Lisboa de Poesia, em 1998;

– o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique, em 2001;

– o Prémio PEN Clube Português, em 2005;

– o Prémio Literário da Fundação Inês de Castro, 2009;

– o grau de Comendador da Ordem de Sant’Iago da Espada, em 2015.

 

Consulte aqui a bibliografia

 

Os amigos

Esses estranhos que nós amamos

e nos amam

olhamos para eles e são sempre

adolescentes, assustados e sós

sem nenhum sentido prático

sem grande noção da ameaça ou da renúncia

que sobre a luz incide

descuidados e intensos no seu exagero

de temporalidade pura

 

Um dia acordamos tristes da sua tristeza

pois o fortuito significado dos campos

explica por outras palavras

aquilo que tornava os olhos incomparáveis

 

Mas a impressão maior é a da alegria

de uma maneira que nem se consegue

e por isso ténue, misteriosa:

talvez seja assim todo o amor

 

Leia aqui outros textos do autor.

 

MJLeite

 

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